«... De pé, olhos bem abertos, face ao Inimigo, unidos em bloco firme, os dentes cerrados, resistir, combater até à morte, na defesa do Património sagrado que herdamos, para, ao menos, salvarmos a honra do nosso nome. Descer as pontes da fortaleza - jamais!» Alfredo Pimenta, in Em Defesa da Portugalidade, p. 29, 1947.
28.9.08
Leitura semanal
Irão/EUA, um duelo dinâmico
A Voz Portalegrense
Knut Hamsun
Knut Hamsun em revista
Ezra Pound
A actualidade de Tintin
A Estrela Misteriosa
Alma Pátria-Pátria Alma
Nunca me enganou
Arqueofuturismo
A justiça francesa quer destruir o movimento Identitário
Leitura para a juventude politizada
Demokratia
Os senhores do mundo
Sobretudo aprender!
Euro-Ultramarino
Quarenta anos sem Ele
Dragoscópio
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 1
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 2
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 3
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 4
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 5
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 6
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 7
Un diamant noir comme l`enfer - pt. 8
Gladius
As moiras encantadas - I
As moiras encantadas - II
As moiras encantadas - III
Manlius
A Petição
Descubra as diferenças...
O comportamento “deles” é sempre superior…
Odisseia
O exílio do povo judeu é um mito...
Pena e Espada
A guerra de Colónia
Entrevista com Pierre Krebs
Um Homem das Cidades
Mengele - o Anjo da Morte de Auschwitz
Sexo dos Anjos
Arquivo Municipal Alfredo Pimenta, de Guimarães
Inconformista
Pt No Media
Pt NovoPress
Revisionismo em Linha
27.9.08
26.9.08
25.9.08
Moses Bensabat Amzalak
O líder judeu que foi condecorado pelos nazis
Em Setembro de 2005, o historiador brasileiro e investigador no Museu do Holocausto em Jerusalém, Avraham Milgram, lançou uma pergunta que se tornou fundamental para os historiadores António Louçã e Isabelle Paccaud: "Onde estão as provas?", questionou ele, em declarações à Pública (edição de 25/09/2005).
Cientista, economista, professor, escritor e investigador, Amzalak possuía um vasto e impressionante currículo: recebeu doutoramentos honoris causa em diversas universidades nacionais e estrangeiras, foi reitor da Universidade Técnica de Lisboa (UTL), presidiu à Associação Comercial de Lisboa, foi membro de várias associações académicas de renome, integrou conselhos de administração de importantes empresas privadas, foi agraciado com a comenda da Legião de Honra francesa e com a Ordem do Império Britânico. E era amigo de Salazar, segundo a historiadora Irene Pimentel.
Através de uma troca de correspondência entre Isaac Weissman, refugiado e representante oficioso do Relief Committee for Jewish War Victims (RELICO) em Lisboa, e o Congresso Mundial Judaico (WJC, na sigla em inglês), de 1943, Louçã descobriu que Amzalak tivera "ligações perigosas" com o regime nacional-socialista de Hitler: recebera a Ordem de Mérito de Primeira Classe da Cruz Vermelha Alemã em 1935 e, enquanto co-proprietário do jornal O Século, aprovara no mesmo ano a publicação de uma separata de dez páginas dedicada à "nova Alemanha".

Neste livro são contados todos os passos que levaram à condecoração de Amzalak pelo Governo nazi (as provas documentais estão em anexo), faz-se uma análise sistemática das edições de O Século entre 1934 e 1939, dá-se a conhecer a política de Amzalak em relação aos refugiados judeus (1933-1945) e é ainda abordada a história dos judeus perante a vaga fascista europeia.
Para entender o contexto em que Moses Amzalak é condecorado não se pode escamotear a sua influência na linha editorial de O Século. Que entre 1926 e 1939 sofreu diversas viragens, diz Louçã ao P2: foi, desde cedo, pró-salazarista (empenhou-se pessoalmente em promover a nova figura da política nacional) e "simpatizava" com o fascismo italiano e com o clerical-fascismo austríaco; em 1935, porém, todos os fascismos se tornaram desinteressantes menos o alemão, que foi tomado pelo diário como o grande modelo, e a Itália só voltou a ter relevo quando se reconciliou com a Alemanha; finalmente, em 39, ano em que Amzalak vendeu a sua quota, eram notórias as reservas à política alemã, cuja glorificação deixou praticamente de existir quando aconteceu o Pacto Germano-Soviético, em finais de Agosto.

Basta atentar nos documentos da embaixada britânica em Lisboa para apurar que foi Amzalak, e não João Pereira da Rosa e Carlos Oliveira, co-proprietários do jornal, o primeiro responsável pela linha editorial. "É a ele que se referem todos os documentos e quando se trata de condecorar alguém é sempre ele o escolhido", afirma o historiador. Para o chefe da Legação Alemã em Lisboa, Oswald von Hoyningen-Huene, a orientação germanófila do periódico era "obra" do dirigente da CIL. Por isso, foi Huene quem propôs ao Governo alemão a condecoração de Amzalak. Fê-lo através de uma carta dirigida ao Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) alemão, datada de 19 de Fevereiro de 1935, precisamente um dia depois da publicação, n"O Século, da separata de propaganda nazi - na primeira página surgem imagens da cruz suástica, uma fotografia de Hitler e outra de Huene, e um editorial assinado por este último. Como se vê através da leitura da carta (em fac-símile nos anexos do livro), não foi apenas a separata que influiu na proposta de Huene. A segunda razão que é referida pelo diplomata prende-se com a criação, em Janeiro de 35, do Gabinete de Documentação Económica e Financeira Alemã, uma iniciativa de Amzalak, que dirigia o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF), e de João Azevedo Neves, reitor da UTL. Na lista de 11 portugueses distinguidos pelo Governo alemão em 1935, apenas Amzalak e Azevedo Neves receberam a mais importante condecoração.
Na missiva ao MNE, Huene explicou os motivos da sua proposta, notando que Amzalak e Neves haviam promovido uma "acção meritória nas relações germano-portuguesas". Tendo conhecimento da retórica violenta (e de alguns boicotes a lojas) que já era propagada na Alemanha contra os judeus, o chefe da Legação alemã fez questão de referir, a título "confidencial", que Amzalak era judeu. Mas, logo a seguir, fundamentou a sua iniciativa: "Como ele é director do Instituto [ISCEF] em que se encontra a Sala de Estudos [Gabinete de Documentação Económica e Financeira Alemã], como tem uma influência determinante nesta instituição e como desempenha um papel político muito importante na qualidade de proprietário do diário O Século, eu consideraria muito inconveniente ignorá-lo, desde que não haja objecções de princípio." E acrescentou que com a carta seguia um artigo do judeu sobre o plebiscito do Sarre. "Não só tornou possível a criação da Sala de Leitura, mas também interveio a nosso favor no jornal dele", escreveu.

A este respeito, António Louçã diz que, sendo a condecoração o resultado de um "relacionamento exploratório" entre a Legação alemã e Amzalak, a distinção, atribuída pelo Governo nacional-socialista através da Cruz Vermelha Alemã (organização que vetava a entrada a judeus), foi um "instrumento de estímulo" para que o líder judaico prosseguisse na defesa das políticas alemães. "A condecoração situa-se cronologicamente no período de quatro anos [1935-39] em que podem ser documentadas as relações de Amzalak com a Legação. Não foi um prémio por esses quatro anos, mas um começo", explica o historiador.
O pedido da "miniatura"
A atribuição da Ordem de Mérito de Primeira Classe da Cruz Vermelha Alemã a Amzalak aconteceu em Julho de 1935, dois meses antes da aprovação das leis de Nuremberga. Será porventura descabido pensar que o presidente da CIL desconhecia a proclamação das leis anti-semitas. Por isso, afigura-se mais espantoso o facto de Amzalak ter pedido ao seu amigo Huene uma "miniatura" da condecoração em 1937, quando a repressão contra os judeus tomava proporções inauditas. Huene voltou então a escrever ao MNE, a 8 de Fevereiro, dando-lhe conta da pretensão de Amzalak. Três meses depois, o reputado português recebeu a "miniatura", acompanhada por uma carta de Huene, escrita em francês. Nela pode ler-se: "Permita-me que aqui lhe envie essa miniatura, pedindo-lhe que queira aceitá-la em lembrança da nossa colaboração."
Em O Segredo da Rua d"O Século, Louçã e Paccaud publicaram uma fotografia, datada de 14 de Maio de 1937, em que Amzalak discursa numa conferência à qual presidiu Huene. Os historiadores supõem (é quase impossível observar isso a olho nu) que o dirigente judeu tenha usado na lapela a miniatura da condecoração que recebera dois anos antes.
Não lhes tendo sido permitido o acesso aos arquivos da CIL, Louçã e Paccaud desconhecem as reacções da comunidade israelita à condecoração do seu líder pelo III Reich e à separata d"O Século. Apesar de o diário não ter publicado uma linha sobre a condecoração, o tributo do regime nazi foi tornado público logo em 1935 pelo jornal Pariser Tageblat, dirigido por alemães antinazis que viviam em França.
A denúncia foi feita num artigo de página inteira, no qual Amzalak é acusado de ter pactuado com a publicação de propaganda nazi e anti-semita no seu jornal, apesar de ser judeu e presidente da CIL.
O feroz artigo do Pariser Tageblat parece não ter surtido qualquer efeito junto do Congresso Mundial Judaico (WJC). O silêncio desta organização manteve-se ao longo de mais de 15 anos. Só em 1951 a organização se pronunciou sobre o caso numa acta que confirma que o Congresso acreditou nas denúncias feitas por Isaac Weissman em 1943. "A acta prova também que o WJC nunca quis tornar públicas essas acusações", nota Louçã, "e que existiu de facto um diferendo grave que quase levou ao congelamento das relações com a CIL".
O documento de 1951 serviu, porém, para restabelecer a ligação entre o WJC e a CIL e, segundo Louçã, isto mesmo poderá ser justificado dentro do contexto das reabilitações operadas no pós-guerra devido à Guerra Fria. "Este foi um dos aspectos mais intrigantes da investigação. A imunidade de que Amzalak gozou talvez se possa explicar pelo clima maccartista do pós-guerra. Entre 1935 e 39, O Século é pró-alemão, apoia a ocupação da Renânia e o plebiscito do Sarre e permite-se mesmo a dar lições à política social do corporativismo português, invocando o modelo alemão", explica Louçã.
Moses Bensabat Amzalak terá sido o único dirigente judeu a receber uma condecoração da Alemanha nazi (a historiografia não refere outro caso semelhante). "Amzalak é ainda visto como um herói e isso permite passar uma esponja por tudo o que está para trás. O que defendemos é que o que está para trás nunca pode ser esquecido", frisa Louçã ao P2.
Na introdução ao livro de Louçã e Paccaud lê-se que a investigação histórica tem, por vezes, algo em comum com as revoluções: "Uma e outras derrubam monumentos."
Maria José Oliveira
In Público, 14 de Março de 2008, págs. 16/17.
24.9.08
23.9.08
Livro: Livro da Ordem de Cavalaria de Ramon Llull

Editado pela Assírio&Alvim em 1992 e em 2002 este texto de Ramón Llull de 75 páginas.
Constituído por sete capítulos, «para demonstrar que os cavaleiros têm honra e senhorio sobre o povo para o ordenar e defender. A primeira parte é do princípio da cavalaria. A segunda é do ofício de cavalaria. A terceira é do exame que deve ser feito ao escudeiro quando quer entrar na ordem de cavalaria. A quarta é da maneira como deve ser feito cavaleiro. A quinta é do que significam as armas do cavaleiro. A sexta é dos costumes que pertencem ao cavaleiro. A sétima é a da honra que deve ser feita ao cavaleiro.»

21.9.08
Leitura semanal
Bónus
Gladius
Proibição de símbolos políticos na Lituânia
Um Homem das Cidades
Judaísmo – Religião ou Refúgio?
Inconformista
Pt No Media
Pt NovoPress
Revisionismo em Linha
20.9.08
Rui Ramos sobre o general Coca-Cola.

«Em 1951, a sucessão do Presidente Carmona provocou fracturas entre os chamados "monárquicos" e os chamados "liberais" (designações, aliás, bastante discutíveis). Craveiro Lopes, o novo Presidente da República, ficou de mal com os "monárquicos". No Verão de 1957, correu que decidira substituir Salazar por Marcello Caetano, ministro da Presidência desde 1955 e considerado um "liberal". (...) Santos Costa, o ministro da Defesa e visto como um "monárquico", passou a opor-se à reeleição de Craveiro, prevista para 1958. Craveiro, pelo seu lado, começou a receber militares revoltados com o ministro da Defesa. O ambiente no interior do regime ficou carregado. Em Abril de 1958, Santos Costa ameaçou Salazar: "Ou isto muda ou tudo se perderá." Pressionado por todos, Salazar hesitou ou fingiu hesitar até ao último instante, mas acabou por afastar Craveiro Lopes.
Foi neste contexto que apareceu a candidatura de Delgado. O general não contou com a força da oposição, mas com a dos salazaristas descontentes pelo afastamento de Craveiro. Fez saber, aliás, saber ao Presidente que, se este quisesse apresentar-se à reeleição contra a vontade de Salazar, ele o apoiaria. Caetano, por sua vez, tentou aproveitar a candidatura de Delgado para convencer Salazar a reeleição de Craveiro, o que levou Salazar, num primeiro momento, a desvalorizar o perigo: podia lá alguém como Delgado, que "lhe fora sempre dedicado" e com que ele simpatizava tanto, vir a causar problemas!»
Delgado foi até ao fim, até ao dia das eleições mas tendo a secreta esperança que o Presidente Craveiro Lopes demitisse o Presidente do Conselho e nomeasse um novo governo, mas anuncia que a sua candidatura é independente, apesar do apoio de todo o reviralho, incluindo o do Partido Comunista que acabou por retirar a candidatura de Arlindo Vicente em prol do general.
Derrotado por Salazar, que viria a demitir Santos Costa e Marcello Caetano e a escolher o almirante Américo Thomaz para a presidência da república. Ora, esta estratégia de Salazar fez com que os apoiantes de Delgado o abandonassem à sua sorte, e Salazar demitiu-o das suas funções e levado ao exílio em 1959.
«Quase toda a gente ressentiu a liderança que o general se quis atribuir, achando-o "autoritário" e até "desequilibrado". Tinha sido a impotência que levara os velhos republicanos e comunistas a juntar-se-lhe. Sabiam que os menosprezava (aos republicanos chamava os "barbas". Ao verem-no tão fraco como eles, começou a custar-lhes aturar o feitio independente e irrequieto do antigo "rapaz da Ditadura", sempre pronto para arriscar tudo em mais um golpe.
Tinha havido um equívoco desde o princípio. Nas suas memórias, Santos Costa, que se dava com o famoso escritor oposicionista Aquilino Ribeiro, conta que lhe perguntou, ainda durante a campanha eleitoral, se a oposição queria mesmo Delgado como Presidente. Aquilino foi sincero: "Mas é evidente que não, meu caro amigo. Nós precisamos, acima de tudo, é de alguém que nos abra a porta. O resto se verá depois."
19.9.08
Público: Judeus, um povo inventado?

Shlomo Sand, historiador na Universidade de Telavive, é "um homem muito corajoso". É ele quem se vangloria ao P2, depois de ter publicado um livro (em hebraico e em francês) e um artigo (no Monde Diplomatique) onde conclui, após oito anos de estudos, que "o povo judeu é uma invenção".
Não, escreve Sand, no século XIII a.C. Moisés "nunca poderia ter conduzido os hebreus para fora do Egipto até à Terra Prometida, porque esta era território egípcio". Não, "não há qualquer vestígio de uma revolta de escravos contra o império faraónico ou uma súbita conquista de Canã por estrangeiros". Não, a população do reino de Judá (posterior Judeia) "não fugiu para o exílio no século VI a.C. - só a elite intelectual foi forçada a instalar-se na Babilónia." Não, não houve um segundo êxodo, em 70 d.C., "porque os romanos nunca deportaram populações" - mesmo que quisessem, não tinham logística para expulsões em massa.
"À excepção de alguns prisioneiros feitos escravos, os habitantes da Judeia continuaram a viver nas suas terras, mesmo após a destruição do Segundo Templo. Uns converteram-se ao cristianismo, no século IV, e a maioria abraçou o islão durante a conquista árabe, no século VII." Os primeiros sionistas, enfatiza Sand, até à grande revolta árabe de 1936-39 na Palestina, sabiam que não tinha havido exílio".
Para fazer valer a sua argumentação, Sand cita David Ben-Gurion, o primeiro chefe do Governo de Israel, e Yitzhak Ben-Zvi, o segundo Presidente, asseverando que um e outro "disseram em várias ocasiões, em 1929, que a maioria dos camponeses da Palestina não tem origem nos conquistadores árabes, mas são genuínos descendentes dos habitantes da antiga Judeia".
"É incrível, mas não há nenhum livro, um único, que prove o exílio de 70 d.C., porque ele nunca aconteceu", empolga-se Sand, que pertence ao grupo dos "novos historiadores", como Benny Morris, Avi Shlaim ou Tom Segev. O grande exílio é um mito "originalmente cristão". A ideia era mostrar um castigo divino por os judeus não terem aceitado Jesus como Messias. No século XIX, tornou-se na "base da ideologia sionista, para legitimar a conquista da Palestina".
Os berberes judeus
Se os judeus não foram expulsos e não houve vinte séculos de errância, "o grande impulso para a judaização", no Norte de África, na Europa de Leste ou no Médio Oriente, "foi um processo de conversões", garante Sand. Entre a revolta dos macabeus, em 167 a.C., até à rebelião de Simon bar Kokhba, em 132 d.C., o judaísmo foi "a religião de mais activo proselitismo" - e foram estas "conversões maciças que, sob influência do helenismo, prepararam o terreno para a subsequente disseminação do cristianismo".
Sem as conversões no mundo pagão, avança Sand, "talvez a religião judaica se tivesse tornado completamente marginal, e poderia até nem ter sobrevivido". Mas enquanto o proselitismo durou, mesmo com um abrandamento depois da vitória do cristianismo, no século IV, "os hasmoneanos judeo-helénicos converteram à força os idumeanos [antigos edomitas] do sul da Judeia e os itureanos da Galileia, e incorporaram-nos no povo de Israel". No Curdistão já emergira, no século I d.C., o reino judeu de Adiabene. E, no Iémen, no século V d.C., apareceu "um vigoroso reino judeu em Himyar, cujos descendentes preservaram a sua fé durante a conquista islâmica até aos nossos dias."
Para fundamentar as suas conclusões, Sand cita "obras romanas, gregas e judaicas", incluindo os escritos de Flávio Josefo, Horácio, Séneca, Juvenal e Tácito. "O ponto de partida para a desconstrução dos mitos da historiografia da história dos judeus" foi, porém, a "nova arqueologia", embora ele nos assegure ter "ido mais longe".
Uma das histórias de conversões que Sand relata no seu livro Matai ve'ech humtza há'am hayehudi?, em hebraico, ou Comment le peuple juif fut inventé: De la Bible au sionisme, em francês (em breve haverá também uma versão inglesa) é a da rainha Dahia al-Kahina. Uma orgulhosa judia, ela foi líder de guerreiros berberes nas montanhas de Aurès (actual Argélia) que repeliram o exército muçulmano invasor do Norte de África, no século VII d.C.
"Perguntei a mim próprio como é que vastas comunidades judaicas apareceram em Espanha", contou Sand ao diário israelita Ha'aretz. "Reparei então que Tariq ibn Ziyad, o supremo comandante dos muçulmanos que conquistou Espanha, era berbere e que a maior parte dos seus soldados eram berberes. O reino judeu berbere de Dahia al-Kahina só tinha sido derrotado 15 anos antes. E a verdade é que há numerosas fontes cristãs a dizer que muitos dos conquistadores de Espanha eram judeus convertidos. As raízes profundas da comunidade judaica de Espanha estão nos soldados berberes que se converteram ao judaísmo."
Khazaria e os yiddish
O que Sand descreve como "a mais significativa conversão em massa" terá ocorrido no século VIII, no reino de Khazaria, situado entre os mares Negro e Cáspio, nas estepes ao longo do rio Volga. "A expansão do judaísmo do Cáucaso até à moderna Ucrânia criou uma multiplicidade de comunidades, muitas das quais se mudaram para a Europa de Leste depois das invasões mongóis", afirma o historiador.
No século VIII d.C., os khazares adoptaram a religião judaica e o hebraico como língua escrita. A partir do século X, este reino enfraqueceu e, no século XIII, foi derrotado pelos invasores mongóis. Sand não duvida que os khazares convertidos, em conjunto com os judeus das terras eslavas e do que é hoje a actual Alemanha, "constituíram a origem das comunidades judaicas na Europa de Leste (...), a base da cultura yiddish".
A influência dos khazares é um ponto de discórdia, que levou outro historiador, Israel Bartal, da Universidade Hebraica, em Jerusalém, a criticar Sand por "inventar uma invenção", embora tenha reconhecido que o livro do colega é "um estudo fascinante" (Há'aretz).
Até por volta de 1960, referiu Sand, "as origens complexas do povo judeu foram mais ou menos, relutantemente, reconhecidas pela historiografia sionista, mas depois foram marginalizadas e acabaram por ser apagadas da memória pública de Israel". Restou apenas o mito da "descendência directa do mítico reino de David", e os judeus passaram a reclamar ser "um grupo étnico específico, que regressou a Jerusalém, a sua capital, depois de 2000 anos de exílio".
Bartal nega que "um inteiro capítulo da história judaica tenha sido silenciado por razões políticas", e foi buscar a sua velha Enciclopédia Mikhal, obra de referência sionista, para relembrar a Sand a passagem sobre os khazares, "nação de origem turca".
Diz a enciclopédia, segundo Bartal: "É irrelevante se a conversão ao judaísmo abrangeu um largo estrato da nação khazar; importante é que este acontecimento foi entendido como um fenómeno de grande significado na história judaica, um fenómeno que desde então desapareceu totalmente: o judaísmo como religião missionária. (...) A questão do impacto a longo prazo desse capítulo da história judaica nos judeus da Europa de Leste - quer através do desenvolvimento do seu carácter étnico ou de outro modo - é um tema que necessita de maior investigação. Em todo o caso, embora não conheçamos a extensão da sua influência, é evidente hoje que esta conversão teve um impacto."
Sand, na conversa com o P2, contrapõe: "Quando Bartal fala dos khazares não realça que eles se converteram ao judaísmo, destaca apenas que, antes de eles se tornarem judeus, muitos judeus já tinham chegado à região provenientes da Palestina. Conseguem ver a diferença?" Bartal, acrescenta Sand, "pertence à velha corporação de historiadores, aqueles que, na Universidade Hebraica, nos anos 1930, decidiram dividir a História Judaica e a História Universal em dois departamentos distintos. Quando alguém, como eu, chega e diz que não acredita na História do Povo de Israel, é natural que eles se sintam chocados."
Apesar de tudo, Sand confessa que esperava de Bartal uma recensão mais implacável. "Das minhas 500 referências, ele menciona três erros e, destes três, só tem razão em um e meio, o que me deixa muito honrado. Também não terá gostado que o livro seja um best-seller há 19 semanas, porque isso mostra que a sociedade israelita se tornou mais plural."
Da Bíblia ao sionismo
Bartal não critica apenas a alusão de Sand aos khazares, mas também a asserção de que "'académicos reputados do passado' ocultaram a verdade no que diz respeito à origem impura dos judeus". O seu contra-argumento é o de que "nenhum historiador do movimento nacional judeu alguma vez acreditou que as origens dos judeus são étnica e biologicamente 'puras'."
E continua: "Jamais um historiador judeu 'nacionalista' tentou ocultar o facto de que as conversões ao judaísmo tiveram um grande impacto na história judaica na Antiguidade e nos primórdios da Idade Média. Embora exista na cultura popular israelita, o mito do exílio da pátria judaica (Palestina) é negligenciado nas mais sérias discussões históricas judaicas. Importantes grupos do movimento nacional judeu exprimiram reservas sobre este mito ou negaram-no completamente."
O que é que Sand tenta provar com este estudo, questionou Bartal. "Que a pátria dos judeus não é a Palestina, que a maioria dos judeus descende de diferentes nações convertidas ao judaísmo e que foram os sionistas a desenvolver, no século XIX, uma ideologia etno-biológica e a inventar o chamado "povo judeu"?
Sim, responde Sand: "Os judeus existiram como religião mas não como uma nação-raça. Foi no século XIX que intelectuais de origem judaica na Alemanha, influenciados pelo nacionalismo germânico, levaram a cabo a tarefa de criar um moderno povo judeu, herdeiro de um reino, errante durante 2000 anos e de regresso à pátria".
"Os primeiros historiadores judeus, como Isaak Markus Jost (1793-1860) e Leopold Zunz, olhavam para o Velho Testamento como uma obra teológica, que reflectia as crenças das comunidades judaicas após a destruição do Primeiro Templo", recorda Sand no Monde Diplomatique. "Só na segunda metade do século XIX é que Heinrich Graetz (1817-1891) e outros desenvolveram uma visão 'nacional' da Bíblia e transformaram a viagem de Abraão para Canã, a fuga do Egipto e o reino unido de David e Salomão num autêntico passado nacional. Pela constante repetição, os historiadores sionistas transformaram, subsequentemente, essas 'verdades' bíblicas na base da educação nacional".
Confrontar a historiografia
Ao contrário de Bartal, e ainda que tenha lamentado a profusão de "histórias pessoais, discussões teóricas e observações sarcásticas", o historiador Tom Segev recomendou a leitura da obra de Sand, qualificando-a como "um dos livros mais fascinantes e desafiantes publicados aqui [em Israel] desde há muito tempo".
"Os capítulos históricos estão muito bem escritos e citam numerosos factos e pontos de vista que surpreenderão muitos israelitas quando os lerem pela primeira vez", adianta Segev, num artigo no Há'aretz, que Sand, entusiasmado, nos leu ao telefone. Compreende-se a satisfação de ser compreendido, depois de ter sido insultado. "Houve quem me chamasse nazi e cão, e cheguei a temer ser alvo de agressões por parte de grupos de extrema-direita que violentamente têm interrompido as minhas palestras".
"Eu sou um especialista em História Contemporânea [sobretudo da França onde completou os seus estudos universitários], mas chegou um momento em que senti que era estúpido viver em Telavive e não estudar a história dos judeus, porque o movimento sionista faz parte da história moderna da Europa", disse Sand ao P2.
"Sabia que ia ser contestado, ao enveredar por outra área. Por isso, fiquei impressionado por o meu livro estar a ser vendido aos milhares. A minha posição é muito radical. O êxito talvez se explique porque as pessoas têm medo que a História não esteja com elas."
"Eu não quis destruir o Estado de Israel", vinca este homem que nasceu em Linz, na Áustria, em 1946, e passou os dois primeiros anos da sua vida num campo de refugiados judeus na Alemanha, "Era meu dever confrontar a mitológica historiografia da história dos judeus. O que eu pretendo é dar outra legitimidade ao Estado de Israel. A velha legitimação não se deve manter, porque não é verdadeira. Nunca regressámos a uma Terra Prometida."
Estado de todos
O livro tem um objectivo político, reconhece Sand: "o de transformar Israel num Estado israelita democrático e não num Estado judaico, porque um terço da população não é judia. Por que é que um rabi em Nova Iorque pode dizer que Israel lhe pertence mais do que um colega árabe israelita da minha universidade?"
Sand avisa: "É preciso mudar a consciência etnocêntrica da sociedade israelita. Não há futuro para um Estado judaico, porque deixa de fora 20 por cento de árabes e 5 por cento de imigrantes que não são considerados judeus. Na Galileia, 65 por cento dos habitantes são árabes. Se amanhã se revoltarem, e disserem que querem criar um Estado como o Kosovo, porque o Estado judaico os exclui, têm todo o direito de o fazer. Imaginam Portugal a proclamar-se um Estado dos cristãos?"
"Se em 10-15 anos, não se tornar num Estado de todos os seus cidadãos, Israel deixará de existir", vaticina Sand, ressalvando que é "pessimista mas não fatalista". A diferença? "Acredito que o futuro não é bom, mas não tenho a certeza. Se a civilização durou o século XX sem uma guerra nuclear, não tenho o direito de ser fatalista."
Antes de o telefonema acabar, mais uma clarificação: "Não sou anti-sionista, mas pós-sionista. A definição de uma pessoa como anti-sionista sugere que é contra a existência do Estado de Israel. Eu aceito o Estado de Israel. Digo que hoje há um povo israelita judeu. O problema é que o sionismo não quer reconhecer a nação israelita e apenas a nação judaica. O nacionalismo árabe também não reconhecia a identidade israelita."
De momento, declara Sand, "sou a favor da solução de dois estados - não um judaico e um árabe, mas um israelita e um palestiniano. Depois, espero que seja criada uma confederação de dois estados. Não defendo um estado binacional porque isso seria pedir aos judeus que se tornassem numa minoria no seu próprio país. É inaceitável."
E é assim que, quase quatro décadas depois de Golda Meir, ex-primeira-ministra israelita, ter dito ao Sunday Times (15 Junho 1969) que "não existe isso a que chamam de povo palestiniano", Shlomo Sand, outro israelita, vem dizer-nos que "o povo judeu é uma invenção". E para ilustrar o que daí resultou, o seu livro abre com uma citação de Karl Wolfgang Deutsch: "Uma nação é um grupo de pessoas unidas por um erro comum quanto à sua origem e uma hostilidade colectiva em relação aos seus vizinhos."»
O respeitinho é muito bonito caso contrário passa-se de jornalista para arrumador de carros. Sem tirar nem pôr!

18.9.08
J Street: Há um novo lobby judeu na América e não tem medo de criticar Israel

17.9.08
16.9.08
Obrigadinho, otários!
E o Platini não ajuda nas custas?
Agora, queixem-se ao tribunal dos direitos humanos...
15.9.08
Livro: Dicionário Imperfeito de Agustina Bessa Luís

Aquilo que podemos chamar desgraça dos dirigentes é a sua desconexão com a massa popular. A democracia acaba em fachada sonsa de uma pequena festa oligárquica; os partidos, produzidos por uma composição de afinidades e sentimentos de grupo restrito, decidem sem a intervenção do povo nas circunstâncias geralmente limitadas a campanhas irreais; campanhas de conteúdo aparentemente cívico e tutelar, como sejam alianças, intervenções e processos persecutórios, internos ou externos, destinados a coroar um valor superlativo do governante. A descolonização foi um desses processos, a entrada na CEE é outro, e assim por diante.
Tudo o que o homem da rua e o burguês resignado podem fazer é conceder a sua confiança ao candidato que – sabe-o muito bem e não isento de azedume – não escolheu. O que explica em parte a renovação dos mandatos, que tão monotamente se sucediam em tempos não distantes, foi sobretudo essa moderação das populações que têm como forma de se terem por inteiradas a familiaridade com o candidato. Aquele que primeiramente parecia mal calhado, e a quem não pouparam a praxe da prova do caloiro que foi sempre, nas comunidades democráticas, como nas estudantis e religiosas, o exercício de competência, acaba por ganhar um direito – o que corresponde à escolha. Por isso é sempre difícil fazer aceitar um candidato novo; o candidato já conhecido tem uma vantagem inegável sobre qualquer outro. O seu carisma pessoal, que transborda para além das suas vicissitudes e limitações, enche o horizonte do eleitor. (…) Nós sabemos que o nosso papel como eleitores é precário.” (pp. 73/74)
Marcelismo
Está em suspenso o carácter verdadeiro desta Revolução. Ela é reivindicada por grupos e autenticada por pressões exteriores, convertida a ideias civis e militares, transformada em guerra moral e em reabilitação da salvação pública. Mas, na realidade, o que aconteceu? Observadores minuciosos, cuja frieza não é suspeita nem de baixa mentalidade, nem da grosseria de impor a sua razão, nem de hipocondria romântica, não se cansam de reflectir sobre a Revolução de Abril. Um fenómeno com bases pré-políticas, ou um acontecimento isolado, vivido por efeito duma extrema paixão e logo absorvido pelo mundano espírito demagógico e as adorações da civilização; tal como a chamada Gloriosa Revolução Inglesa, esquecido pelo soberano menor que é o povo?
Contudo, o delicado problema, que desde o início perturbou até aqueles que com infalível precisão agiram no 25 de Abril, continua por resolver: o que significa a Revolução Portuguesa? Dizer que foi uma opção que alterou o curso da nossa História, não explica nada.
Os dois principais aspectos positivos: a euforia, que no povo tem historicamente o papel dum sensibilizante quanto a toda a espécie de apetites inumanos que a civilização lhe incute; e a medida da tragédia, que foi criando nas pessoas a ideia de que qualquer poder não sobrevive em comum com quaisquer ilusões.
Os negativos são os equívocos e o amadorismo. Quando se trata de observar a realidade, tudo tem a mesma importância – a realidade oculta, a aparente, o seu processo e a sua origem. É a vida duma nação que está em causa, e não só a sua representação em homens ou em ideias.” (pp.254/255)
14.9.08
Leitura semanal
A experiência construtiva do Nacionalismo
Fascismo
Nacionalismo
Civilização
A Voz Portalegrense
Carl Schmitt
Carl Schmitt
Ensino da História em Portugal I
Ensino da História em Portugal II
Ensino da História em Portugal III
Ensino da História em Portugal IV
Ensino da História em Portugal V
Caceteiro
O último combate do Augusto de Castilho
Demokratia
Sobre as eleições em Angola
O preço das "Amplas Liberdades" (5)
Dragoscópio
Democracia
Gladius
Recordar um dos marcos da libertação europeia contra o invasor muçulmano
Jantar das Quartas
A História contada nas escolas
O fim da nossa história?
O fim do nosso povo?
Manlius
Katyn para sempre recordar
7 de Setembro - Dever de Memória
O "nosso chinês" de Tianamen
Omar e o traidor traído
Os crimes dos "bons"
Mas o rei vai nu
A primeira remessa dos novos equipamentos para o Exército
O Sexo dos Anjos
"Prender menos foi uma opção política"
711 Anos do Tratado de Alcanizes
Pena e Espada
Hacienda de la Fuente
Nota sobre O Senhor dos Anéis
Guerra mediática
Reverentia
A loucura e a falta de senso...
O Pasquim da Reacção
Abril é holocausto
Último Reduto
Grandes feitos da tugolândia moderna e arejada
Bloquismo histórico
Um homem das Cidades
Sionismo e Anti-Semitismo: uma estranha aliança através da história
Truman e Bush, de bestas a bestiais? - por João Pereira Coutinho do Expresso
O valor da (des)informação no Expresso
O ciclo do petróleo por Jon Stewart
Konzentrationslager Palestina - Arbeit Macht Frei
Inconformista
Pt No Media
Pt NovoPress
Revisionismo em Linha
13.9.08
12.9.08
Livro: Contra-subversão em África de John P. Cann

«Os ataques de 4 de Fevereiro em Luanda foram desencadeados por homens ligados à UPA, apoiados na sombra pelo Cónego Manuel das Neves, vigário-geral da Arquidiocese. Tomaram parte no assalto simpatizantes da UPA, do MPLA ou apenas nacionalistas. Todavia, o MPLA reivindicou a acção, em Conacri.» (p. 44)
«Todavia, o Exército Português resolveu estes problemas e em 1970 tinha ganho o controlo dos conflitos nos três teatros sublevados. Podia então afirmar que tinha a força estruturada correcta, adequadamente treinada e conduzida, que aplicava com êxito conceitos adaptados à situação em África e que os conflitos estavam relativamente sob controlo. Estes não foram pequenos feitos. O objectivo de conseguir um conflito controlado, de baixa intensidade, tinha sido atingido, lado a lado com uma sustentabilidade por tempo aparentemente indeterminado.» (p. 103)
11.9.08
Moçambique - 7 de Setembro por António Maria Zorro

Mas nessa já quase outoniça tarde de Setembro, Costa Gomes e Vasco Gonçalves puseram a funcionar a mais espantosa de desinformação que até hoje se conhece neste desinformado país: sobre os ocupantes do Rádio Clube foram lançadas as mais sórdidas e mais falsas acusações que poderiam imaginar-se; todas as notícias vindas de Lourenço Marques foram cortadas ou manipuladas, toda a verdade foi distorcida até ficar irreconhecível; quando, ao cabo de 72 horas de resistência admirável, os ocupantes do Rádio Clube traídos por todos quantos lhes deveriam dar apoio, se viram forçados a desistir do seu patriótico intento, a opinião pública metropolitana mergulhou na total ignorância do que acontecera nesses três dias históricos e do que logo depois viria a acontecer – uma chacina monstruosa.
Decorridos mais de três anos essa ignorância é hoje quase tão densa como então, quebrada que foi apenas pela obra de Ricardo Saavedra “Aqui Moçambique Livre”, breve e empolgante inventário daqueles acontecimentos, que se editou em Joanesburgo mas que as amplas liberdades do PREC não permitiram se divulgasse devidamente. E acontece, deste modo, que de todos os terríveis casos da “descolonização exemplar” o do “7 de Setembro” é, sem dúvida, o menos conhecido.

“Moçambique 7 de Setembro” é uma obra relevante na já vasta bibliografia escalpelizadora da tal “descolonização exemplar”, de que hoje fingem indignar-se alguns dos próprios culpados mais directos. É-o não só pelas páginas dedicadas aos acontecimentos decorridos dentro ou fora do Rádio Clube de Moçambique, mas igualmente por aquelas em que se historiam, com simples mas flagrantes anotações, os antecedentes de ordem pessoal ou factual que levaram ao trágico epílogo de todos nós conhecido.
Em boa verdade, não sei o que será mais arrepiante neste livro: se a descrição do terror que se abateu sobre Lourenço Marques depois das autoridades haverem entregue o microfone do Rádio Clube de Moçambique a um militante da Frelimo, se a revelação – corajosa e implacável – de todo um cortejo de abdicações vergonhosas, de traições imperdoáveis, de omissões pusilânimes – e mesmo de ingenuidades – e mesmo de ingenuidades incríveis. De qualquer modo, é um livro para ler atentamente, retendo, por igual, as imagens negativas e positivas que dele se contêm, da mais repulsiva delinquência ao mais abnegado heroísmo, pois de ambas as espécies é feita a verdade.
Não cabe, é claro, no âmbito desta crónica, procurar responder a perguntas que a leitura do livro de Gonçalo Mesquitela inevitavelmente nos propõe: tinha o heterogéneo movimento do “7 de Setembro” capacidade para deter Moçambique no caminho do abismo? Teria, caso lhe não faltassem os apoios prometidos, conseguido alterar o curso da História? Estas ou outras indagações nada têm a ver com a obra em causa, que é, sobretudo, um documento imprescindível para quem queira conhecer a verdade dos factos, mas um documento onde a frieza e a objectividade da análise não podem – não poderiam nunca – ignorar o espírito de gesta que animou aqueles “rebeldes” de uma “revolução sem armas”, os últimos que souberam honrar em Moçambique a bandeira da Pátria destruída.
In jornal A Rua, 1977, p. 19.
10.9.08
Algumas verdades sobre a traição em Angola

«Poucas semanas antes da eclosão dos acontecimentos que tiveram lugar no Norte de Angola, Holden encontra-se com Franz Fanon em Tunes e, segundo testemunho da esposa de Fanon, teria dito: “Esteja atento no dia 15 de Março, o dia em que vai ser debatida na ONU a moção apresentada pela Libéria; algumas coisas muito importantes irão acontecer em Angola.” Toda a operação tinha sido planeada com tempo e as diversas acções convenientemente programadas.
Apesar das opiniões, algumas contraditórias, que apareceram na imprensa de todo o mundo sobre as origens, evolução e consequências dos acontecimentos que então tiveram lugar, a realidade era só uma e duma crueldade inconcebível, podendo ser sintetizada nos seguintes pontos:
- Em poucos dias, com início em 15 de Março, milhares de pessoas são exterminadas, entre brancas e pretos, sem que se vislumbre uma conexão clara entre causas e efeito.
- A retaliação das populações, em especial dos colonos brancos, não se fez esperar, matando indiscriminadamente, num desespero total ou simples acto de vingança.
- O racismo surge na sua componente mais dramática, a do sangue, a da morte: és preto, és culpado dos assassínios; és branco, vais matar-me e eu tenho de defender-me!!
Era difícil descrever o clima de medo, verdadeiro pavor, autêntico inferno, que se vivia em Angola, desde Luanda, onde afluíam os colonos que tinham escapado ao genocídio, até à fronteira norte com Congo, abrangendo uma área superior à de Portugal continental. As forças da ordem eram por demais insuficientes, para devolver àquela gente, claramente aterrorizada, um mínimo de tranquilidade que lhes permitisse agir duma forma racional, impedindo o agravamento da situação. Reinava o pânico, o ódio, a sede de vingança.
O pronunciamento de Salazar estava correcto. “Para Angola rapidamente e em força.” Não tínhamos alternativa se pretendíamos restabelecer a ordem naquele território.» (pp. 184/185)
«Em 5 de Abril de 1962, a FNLA cria o GRAE (Governo Revolucionário de Angola no Exílio), afirmando dispor de um aparelho administrativo, judicial e militar que lhe permitia o controlo efectivo o território de Angola, o que não passava de pura utopia ou miragem e que tinha apenas fins propagandísticos. No seguinte, é fundada em Adis-Abeba a OUA (Organização de Unidade Africana), que quase de imediato, reconhece o GRAE em prejuízo do MPLA, ao qual não reconhece capacidades para levar a luta armada até ao interior de Angola. Neste seu início de vida, e até 1964, este governo teve no desempenho das funções de Ministro dos Estrangeiros o Dr. Jonas Malheiro Savimbi que desenvolveu uma intensa actividade diplomática não só em África mas igualmente na Europa, com o fim de recolher apoios tanto políticos como igualmente de material. O seu exército, ELNA (Exército de Libertação Nacional de Angola), dispunha do apoio político dos EUA, sendo o apoio material circunscrito a uma pequena ajuda financeira. As armas provinham essencialmente do Congo sob o patrocínio dos Estados Unidos, e de outros países africanos, em especial da Tunísia. O treino dos guerrilheiros, embora se verificasse em alguns Estados de África, era essencialmente concretizado no campo de Kinkusu, cerca de sessenta quilómetros a sul de Leopoldville, a cargo de especialistas chineses de Taiwan. Embora nos estivesse interdito, no âmbito da contra-subversão, toda e qualquer acção fora do território sob a administração nacional, a fim de evitar conflitos diplomáticos com os países limítrofes, em 1963 propus ao comandante da Região sobrevoar, com a discrição possível, em missão de reconhecimento fotográfico, o campo de treinos de Kinkusu. O Gen. Brilhante Paiva, começou por sorrir pois, conforme explicou, já tinha pensado no assunto. Deu a sua anuência mas a questão ficaria, por agora, só no âmbito da Força Aérea. A missão foi realizada, os elementos de informação colhidos através da fotografia vertical e explorados pelos serviços especializados. Não houve qualquer reacção diplomática a esta incursão e não deixei de pensar como seria fácil desferir um golpe mortal a todo o complexo com um bombardeamento maciço aos primeiros alvores. Julgo que seria uma forte machadada no já débil potencial de combate inimigo. Mas se sobrevoar era susceptível de ser sempre justificável com um erro de navegação, já este tipo de acção poderia trazer sérias complicações no campo internacional. A reforçar esta nossa convicção, sobrepunha-se, naturalmente, a política conduzida pelos órgãos do poder central, continuando a insistir na tecla do “problema policial de ordem interna”.
Paralelamente, o MPLA sentia enormes dificuldades em se projectar política e militarmente por:
- cisões nas cúpulas do movimento;
- exiguidade de apoios internos que se limitava ao treino de guerrilheiros nos países do bloco soviético;
- restrições e até proibição de todas as actividades no território do Congo imposta pelo respectivo governo;
- perseguição movida pela FNLA não só dentro do território de Angola como igualmente no Congo.» (p. 220/221)
«Holden Roberto, talvez mais preocupado com a sua projecção no campo internacional que com a guerra que conduzia desde 15 de Março de 1961 e onde parece nunca ter participado, assim como qualquer dos seus quadros superiores, começou a cair em desgraça, chegando mesmo a escrever por duas vezes ao presidente Kennedy. Vivendo à sombra dos louros conquistados com a mortandade e as atrocidades cometidas no início da subversão no Norte de Angola, passou a concentrar a sua atenção no campo diplomático pelos estados penalizadores para o seu movimento, especialmente entre os membros da NATO.» (p. 222)
«No entanto e apesar da guerra, muito se fez e bastará recordarmos que, para o ano de 1974, o orçamento de Angola era o terceiro de toda a África, apenas suplantado pelo do da África do Sul e da Rodésia de Ian Smith.» (p. 304)
In General Silva Cardoso, Angola, Anatomia de uma tragédia, Oficina do Livro, 2000.