30.8.08

A realidade romena segundo Gregori Dumitrescu

«Senti-me colhido de surpresa pelo objectivo do russo que tinha na minha frente. Uma vez mais verifiquei que o mundo capitalista com o qual Ivan estava aparentemente zangado tinha concluído a aliança mais absurda de toda a história do mundo ao ajudar um inimigo moral. Depois de combater contra o formidável exército da Alemanha nacional-socialista, porque não se constituiu em obstáculo contra a enxurrada soviética na Europa? Sem a ajuda americana e sem os bombardeamentos maciços levados a cabo contra a Alemanha pelas “fortalezas voadoras”, jamais os russos teriam saído das suas fronteiras. Um desembarque americano nas costas do Mar Negro seria bem visto pelos países limítrofes que olhavam com a maior inquietação o avanço do exército soviético.
Os americanos que se dizem “libertadores” não merecem esse nome porque ajudaram as tropas soviéticas a invadir a Europa. A sua concepção de liberdade é pouco coerente. Podiam parar o avanço dos carros, fiacres e carroças que transportavam o exército soviético para o Ocidente e não o fizeram.» (p. 78)

«Se a Roménia pós-1944 se tivesse livre desse tipo de gente, os comunistas jamais teriam governado, mesmo com a ajuda total da União Soviética. Digamos que os que se juntaram aos comunistas para não perderem o pão quotidiano ou a esperança da família não podem ser propriamente oportunistas. Neste caso, tratava-se de arrivistas, e muitos não deram conta a que ponto eram abomináveis. Vi gente que em 1944 saudava à maneira das SS alemães e que pouco depois fazia a saudação comunista de punho fechado. Vi especuladores vulgares para quem o dinheiro não tinha cheiro que depois de 1944 não paravam de apregoar o progresso social… Vi também anti-semitas notórios chorar nos braços de judeus e judeus a apertar-lhes a mão como «como camaradas».
Os piores especuladores de ontem são hoje progressistas, os admiradores mais fanáticos do Nacional-Socialismo e do Fascismo fizeram-se comunistas e anti-fascistas.» (p. 79)

«O Verão tinha passado e o 19 de Novembro de 1946 não estava longe. Toda a nação aguardava esse dia para mostrar com votos que recusava a ingerência da União Soviética nos assuntos internos da Roménia.
O governo imposto em 6 de Março de 1945 era considerado comunista, mesmo se vários ministros não eram comunistas. Uma vez em funções, o governo Croza substituiu os que detinham postos-chave nos Ministérios por elementos afectos aos comunistas. Em 19 de Novembro ia ver-se a vontade do povo. No dia da votação, todos se comportaram como antes de uma batalha, ninguém ficou em casa.
Os habitantes das cidades saíram para a rua como se cada um deles não quisesse ser suspeito de passividade num dia em que era necessário mostrar que queríamos ser livres no nosso país. Nas aldeias, o ambiente era de festa, de festa nacional. Cantavam-se canções em grupo nas estradas do país… Toda a gente votou. Era considerado um dever de todos os romenos.
Quando se abriram as urnas, muitas não tinham mais que um voto para o Partido Comunista, apesar de cada partido ter dois representantes. O que significa que os aliados dos comunistas tinham votado em Iuliu Maniu. Os escrutinadores comunistas franziram o sobrolho e os aliados, culpados, fingiram-se inocentes, alegremente inocentes.
Os russos tinham formado uma divisão chamada “Horia, Closca e Crisan” com prisioneiros romenos instruídos por comissários soviéticos trazidos para a Roménia depois da “libertação”. A contagem dos votos nos quartéis deu 80% à oposição, ou seja, a Iuliu Maniu.
Esperou-se ansiosamente a publicação dos resultados, mas os romenos ficaram siderados ao verem que os jornais celebravam em títulos de caixa alta na primeira página a brilhante vitória do Bloco de Partidos Democráticos. O povo romeno acaba de “derrotar a reacção de uma vez por todas…” Depois desse “resultado”, a face do país mudou… A partir de então, passou a ser um país de resignados, ninguém duvidava que a União Soviética fazia o que queria.» (p. 78)

1 comentário:

Anónimo disse...

Ora aí está um livro a não perder. Quando o vi exposto nas bancas da FNAC pareceu-me logo mais uma pedra no charco. Confirma-se agora pelo excerto aqui publicado.