«... No opúsculo que consagrei a opor ao António Sardinha lendário e mítico, o António Sardinha histórico e verdadeiro, com as suas qualidades e virtudes, e os seus defeitos e carências; numa palavra, no opúsculo em que opus ao António Sardinha, taumaturgo e mistificação, o António Sardinha carnal e humano — na altura em que aludia à existência doutros valores, escrevi estas palavras pesadas, medidas e pensadas: «E houve e há o Prof. Oliveira Salazar que, nos três volumes dos seus Discursos, se nos revelou um dos grandes Mestres do pensamento político português».
Já em Abril de 1935 -, precisamente em 20 de Abril de 1935 - há, portanto, nove anos, ao apreciar o primeiro volume dos Discursos então publicados, tive a ocasião de colocar a personalidade do seu autor no lugar devido, dentro do quadro da mentalidade portuguesa.
...Muitas vezes, ao ler os Discursos do Chefe do Governo, acodem ao meu espírito as páginas célebres do livro de Cícero, e as não menos famosas de Tácito. E do que um e outro dizem ou põem na boca das suas personagens, eu extraio a substância eterna: não é a Retórica ou a Oratória que faz o Orador; é este que faz aquela.
O Orador Oliveira Salazar escapa ao enquadramento que quem quer que seja deseje impôr-lhe. Não é orador forense, nem orador parlamentar, nem orador académico: é um orador político. Como orador político, não é orador de assembleias, ou tribunas comiciais. E não visa, em seus discursos, aquele objectivo que, segundo Cícero, é o da Eloquência: acalmar ou comover os ouvintes excitados ou frios - «aut sedandis aut excitandis».
Como orador político, o Chefe do Governo é o orador-pensador, o orador-professor que desenvolve, diante dos que o ouvem, os termos duma equação algébrica.
É um orador do seu tempo. É um orador da sua escola.
Não faz lembrar ninguém, porque é um orador pessoal, que expõe o seu pensamento, mediante expressões que são suas.
Como no orador de Tácito, há em Salazar os recursos «ex multa eruditione et plurimis artibus et omniem rerum scientia». Sem a muita literatura, a abundância dos conhecimentos, e a ciência geral, Salazar não poderia dar à expressão do seu pensamento, o geometrismo totalitário que a caracteriza.
Nos seus Discursos, debatem-se problemas de administração, apresentam-se ou justificam-se soluções de questões internas ou externas, esboçam-se directrizes a adoptar, vincam-se tendências a utilizar, etc. Está neles, a vida do Estado português na sua complexidade fundamental, na sua tessitura essencial, desde 1928 para cá.
E é por isso que, através de toda a paisagem multiforme que estas mil e duzentas páginas oferecem à Crítica, há, para além do que é episódico ou propriamente temporal, um pensamento político, uma filosofia política, uma doutrina política ¾ pensamento, filosofia e doutrina que colocam o Chefe do Governo português na primeira fila dos grandes Mestres do pensamento político português.
É possível, e devia fazê-lo quem tivesse vagar para tal, organizar-se uma espécie de Summa Política, com os pensamentos, conceitos, sentenças que Salazar espalhou pelas mil e duzentas páginas dos três volumes dos seus Discursos - em que se algumas vezes se limita a sintetizar, em fórmulas precisas, pensamentos vagos ou informes, errantes ou confusos, outras vezes cria ele próprio ideias, atitudes ou posições doutrinárias.
No conjunto difuso, por força da própria natureza das coisas, pela multiplicidade dos objectivos e pela variedade dos motivos - sobressaem, frutos de lapidação magistral, as sentenças, os conceitos, os pensamentos, que serão um dia, quando este País, vencido o temporal, regressar da crise moral e intelectual em que se debate, citados, lembrados, invocados como característicos desta época, e tomados como ponto de partida para elocubrações do Espírito.
Hoje, é cedo. Estamos todos a naufragar em vagas fundas da Mesquinhês, Inveja, Petulância, Rancor e Imbecilidade, pasmando a gente de que este homem sofreie a náusea que o ambiente lhe deve provocar, e encontre em si próprio estímulos ou pontos de apoio para se manter na tentativa de dar à hora que passa a aparência de grandeza e beleza ¾ contra a Mediocridade que rosna, o Despeito que calunia, a Estupidez que malsina, o Egoísmo que deforma, a Hipocrisia que envenena, a Impaciência que perturba, e a Ambição que corrompe. Porque é o Pensamento em Acção, e porque esta dispõe de elementos que o Pensamento, só por si, não possui, Salazar consegue fazer-se ouvir, e, às vezes, comentar. É porém tão forte esse Pensamento, tão carregado de substância, que ultrapassará o momento do encerramento da Acção, e constituirá, no futuro, não só o objecto de digressões históricas, mas também de investigações especulativas.
O que nós não sabemos ou não queremos fazer hoje - o Enchiridion do pensamento salazariano, outros o farão um dia, se não se subverter tudo com a catástrofe que paira sobre o mundo e está a destruir sistematicamente tudo o que conseguiu vencer a demolição lenta do Tempo, na sua acção multi-milenária - em nome da Civilização e da Liberdade dos Povos!
Sim. Contra todos os rancores impotentes e inquietos, o Pensamento Político de Salazar projectar-se-á, e será objecto de estudo profundo e sério, quando dos mistificadores ou bolas de sabão, das bexigas ou balões infantis, não houver mais do que vagas lembranças em ruínas.
Ele ficará, no geometrismo totalitário da sua expressão, na pureza translúcida da sua essência, e na fulguração estelante da sua força, como, na França, o pensamento dum Pascal ou dum Maurras, na Alemanha, o Pensamento dum Schopenhauer ou dum Nietzsche.
Essencialmente católico, essencialmente português, não o crestam os tufões da Revolução e da Enciclopédia, e por isso ele marca, no quadro da vida histórica de Portugal, o lugar único do Pensamento em Acção, e no grande panorama do Pensamento político português, um dos lugares primaciais dos seus Mestres.
Lugar único do Pensamento em Acção, porque ele foi o único, até agora, que levou para a Acção governativa o propósito de um Pensamento político puro. Entrou no Poder, não só para administrar, mas para doutrinar - realizando.
Livre de quaisquer compromissos, não tendo hipotecado a ninguém os seus passos, entrou no Poder, não para servir os interesses deste ou daquele, não para realizar o programa deste ou daquele, mas para pôr em acção o seu pensamento que pretende ser, paralelamente, e sendo-o de facto, o Pensamento de muitos outros, ou da sua época, nem por isso deixaria de ser o seu Pensamento, e só como seu seria tratado.
Tem-se sido propício o Poder, na consecução do seu projecto, na realização do seu objectivo?
Isso é outro problema.
Note-se que estou a referir-me ao seu Pensamento político, e não à sua acção administrativa. Neste último campo, tem tido colaboradores apreciáveis. Mas na efectivação do seu Pensamento político, tem sido - totus, solus at unus. Não discuto as razões. Verifico o facto.
Nestes três volumes dos Discursos, o que superiormente me interessa é precisamente a Filosofia política que os informa, ou a substância filosófica que os alimenta, porque é ela que consagra o seu autor, como um dos grandes Mestres do Pensamento político português. Não fosse ele um destes, e nunca se teriam celebrado os dois centenários - o da Fundação e o da Restauração do Estado português, com o Equilíbrio, a Superioridade espiritual e a compreensão portuguesa que caracteriza essa comemoração.
E é esse Mestre do Pensamento político português - um dos maiores que a nossa Literatura contém, que quero, neste momento, saudar e festejar.»
Já em Abril de 1935 -, precisamente em 20 de Abril de 1935 - há, portanto, nove anos, ao apreciar o primeiro volume dos Discursos então publicados, tive a ocasião de colocar a personalidade do seu autor no lugar devido, dentro do quadro da mentalidade portuguesa.
...Muitas vezes, ao ler os Discursos do Chefe do Governo, acodem ao meu espírito as páginas célebres do livro de Cícero, e as não menos famosas de Tácito. E do que um e outro dizem ou põem na boca das suas personagens, eu extraio a substância eterna: não é a Retórica ou a Oratória que faz o Orador; é este que faz aquela.
O Orador Oliveira Salazar escapa ao enquadramento que quem quer que seja deseje impôr-lhe. Não é orador forense, nem orador parlamentar, nem orador académico: é um orador político. Como orador político, não é orador de assembleias, ou tribunas comiciais. E não visa, em seus discursos, aquele objectivo que, segundo Cícero, é o da Eloquência: acalmar ou comover os ouvintes excitados ou frios - «aut sedandis aut excitandis».
Como orador político, o Chefe do Governo é o orador-pensador, o orador-professor que desenvolve, diante dos que o ouvem, os termos duma equação algébrica.
É um orador do seu tempo. É um orador da sua escola.
Não faz lembrar ninguém, porque é um orador pessoal, que expõe o seu pensamento, mediante expressões que são suas.
Como no orador de Tácito, há em Salazar os recursos «ex multa eruditione et plurimis artibus et omniem rerum scientia». Sem a muita literatura, a abundância dos conhecimentos, e a ciência geral, Salazar não poderia dar à expressão do seu pensamento, o geometrismo totalitário que a caracteriza.
Nos seus Discursos, debatem-se problemas de administração, apresentam-se ou justificam-se soluções de questões internas ou externas, esboçam-se directrizes a adoptar, vincam-se tendências a utilizar, etc. Está neles, a vida do Estado português na sua complexidade fundamental, na sua tessitura essencial, desde 1928 para cá.
E é por isso que, através de toda a paisagem multiforme que estas mil e duzentas páginas oferecem à Crítica, há, para além do que é episódico ou propriamente temporal, um pensamento político, uma filosofia política, uma doutrina política ¾ pensamento, filosofia e doutrina que colocam o Chefe do Governo português na primeira fila dos grandes Mestres do pensamento político português.
É possível, e devia fazê-lo quem tivesse vagar para tal, organizar-se uma espécie de Summa Política, com os pensamentos, conceitos, sentenças que Salazar espalhou pelas mil e duzentas páginas dos três volumes dos seus Discursos - em que se algumas vezes se limita a sintetizar, em fórmulas precisas, pensamentos vagos ou informes, errantes ou confusos, outras vezes cria ele próprio ideias, atitudes ou posições doutrinárias.
No conjunto difuso, por força da própria natureza das coisas, pela multiplicidade dos objectivos e pela variedade dos motivos - sobressaem, frutos de lapidação magistral, as sentenças, os conceitos, os pensamentos, que serão um dia, quando este País, vencido o temporal, regressar da crise moral e intelectual em que se debate, citados, lembrados, invocados como característicos desta época, e tomados como ponto de partida para elocubrações do Espírito.
Hoje, é cedo. Estamos todos a naufragar em vagas fundas da Mesquinhês, Inveja, Petulância, Rancor e Imbecilidade, pasmando a gente de que este homem sofreie a náusea que o ambiente lhe deve provocar, e encontre em si próprio estímulos ou pontos de apoio para se manter na tentativa de dar à hora que passa a aparência de grandeza e beleza ¾ contra a Mediocridade que rosna, o Despeito que calunia, a Estupidez que malsina, o Egoísmo que deforma, a Hipocrisia que envenena, a Impaciência que perturba, e a Ambição que corrompe. Porque é o Pensamento em Acção, e porque esta dispõe de elementos que o Pensamento, só por si, não possui, Salazar consegue fazer-se ouvir, e, às vezes, comentar. É porém tão forte esse Pensamento, tão carregado de substância, que ultrapassará o momento do encerramento da Acção, e constituirá, no futuro, não só o objecto de digressões históricas, mas também de investigações especulativas.
O que nós não sabemos ou não queremos fazer hoje - o Enchiridion do pensamento salazariano, outros o farão um dia, se não se subverter tudo com a catástrofe que paira sobre o mundo e está a destruir sistematicamente tudo o que conseguiu vencer a demolição lenta do Tempo, na sua acção multi-milenária - em nome da Civilização e da Liberdade dos Povos!
Sim. Contra todos os rancores impotentes e inquietos, o Pensamento Político de Salazar projectar-se-á, e será objecto de estudo profundo e sério, quando dos mistificadores ou bolas de sabão, das bexigas ou balões infantis, não houver mais do que vagas lembranças em ruínas.
Ele ficará, no geometrismo totalitário da sua expressão, na pureza translúcida da sua essência, e na fulguração estelante da sua força, como, na França, o pensamento dum Pascal ou dum Maurras, na Alemanha, o Pensamento dum Schopenhauer ou dum Nietzsche.
Essencialmente católico, essencialmente português, não o crestam os tufões da Revolução e da Enciclopédia, e por isso ele marca, no quadro da vida histórica de Portugal, o lugar único do Pensamento em Acção, e no grande panorama do Pensamento político português, um dos lugares primaciais dos seus Mestres.
Lugar único do Pensamento em Acção, porque ele foi o único, até agora, que levou para a Acção governativa o propósito de um Pensamento político puro. Entrou no Poder, não só para administrar, mas para doutrinar - realizando.
Livre de quaisquer compromissos, não tendo hipotecado a ninguém os seus passos, entrou no Poder, não para servir os interesses deste ou daquele, não para realizar o programa deste ou daquele, mas para pôr em acção o seu pensamento que pretende ser, paralelamente, e sendo-o de facto, o Pensamento de muitos outros, ou da sua época, nem por isso deixaria de ser o seu Pensamento, e só como seu seria tratado.
Tem-se sido propício o Poder, na consecução do seu projecto, na realização do seu objectivo?
Isso é outro problema.
Note-se que estou a referir-me ao seu Pensamento político, e não à sua acção administrativa. Neste último campo, tem tido colaboradores apreciáveis. Mas na efectivação do seu Pensamento político, tem sido - totus, solus at unus. Não discuto as razões. Verifico o facto.
Nestes três volumes dos Discursos, o que superiormente me interessa é precisamente a Filosofia política que os informa, ou a substância filosófica que os alimenta, porque é ela que consagra o seu autor, como um dos grandes Mestres do Pensamento político português. Não fosse ele um destes, e nunca se teriam celebrado os dois centenários - o da Fundação e o da Restauração do Estado português, com o Equilíbrio, a Superioridade espiritual e a compreensão portuguesa que caracteriza essa comemoração.
E é esse Mestre do Pensamento político português - um dos maiores que a nossa Literatura contém, que quero, neste momento, saudar e festejar.»
(In Os Discursos do Chefe do Governo, in «Esfera», n.º 89, p. 4. 1944.)
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«... É um regalo excepcional para o meu espírito, ouvi-lo ou lê-lo. Subtil, sem ser incompreensível ou difícil; claro, tem de ser banal; castigado na forma de se exprimir, sem cair em requintes doentios — e depois, acima disso tudo, embebido numa doutrina que só não é perfeita por lhe faltar o fecho da abóbada — o espírito do sr. Presidente do Conselho é do mais formosos espíritos políticos da nossa História.
O infeliz Trindade Coelho tinha razão: fala europeu. Ao nacionalismo da sua linguagem corresponde o universalismo do seu pensamento.
Salvo raras excepções os governantes do Estado que a República revelou ou teve falavam pretoguês, e o seu pensamento era, quando muito, um pensamento de botequim ou de baiúca. Os melhores ainda chegavam ao pensamento de partido. Nenhum atingira o pensamento nacional: o sr. Presidente do Conselho Oliveira Salazar ultrapassa as fronteiras da Nação: é o pensamento europeu, no que este tem de mais profundo e mais sólido.
Voto, pois, em primeiro lugar, na Inteligência, que o sr. Presidente do Conselho representa.»
O infeliz Trindade Coelho tinha razão: fala europeu. Ao nacionalismo da sua linguagem corresponde o universalismo do seu pensamento.
Salvo raras excepções os governantes do Estado que a República revelou ou teve falavam pretoguês, e o seu pensamento era, quando muito, um pensamento de botequim ou de baiúca. Os melhores ainda chegavam ao pensamento de partido. Nenhum atingira o pensamento nacional: o sr. Presidente do Conselho Oliveira Salazar ultrapassa as fronteiras da Nação: é o pensamento europeu, no que este tem de mais profundo e mais sólido.
Voto, pois, em primeiro lugar, na Inteligência, que o sr. Presidente do Conselho representa.»
(In Eu voto! E porque voto?, in «A Voz», n.º 2811, pp. 1/6, 14.12.1934.)
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