ESCRITO NO SANGUE
Para os meus sobrinhos Mió e Eugénio
Foste, às praias d`outrora, ver partir uma nave?
Vai vê-la regressar, fremente, aos aeroportos.
Tem, agora, o perfil triunfal de uma ave,
Mas nas entranhas traz cinco séculos mortos!
Deixou, no além-mar, um farrapo de pragas,
A memória do ódio, o turbilhão das fugas.
Traz, oculto, a sangrar por vinte e cinco chagas,
Um pavilhão de medo e envergonhadas rugas.
Esperava-a o pó, os fétidos detritos,
O crime da indiferença e a fome das crianças.
Antes tudo acabar numa explosão de gritos
Do que este tropeçar no gume das vinganças!
Foste, às praias d`outrora, ver partir um navio?
Vai vê-lo regressar, sem glória, aos aeroportos.
Antes fosse vazio e viesse vazio.
Mas nas entranhas traz cinco séculos mortos!
António Manuel Couto Viana
(21.11.1976)
In “Sou quem fui – Antologia Poética”, p. 127. Edições Ática,2000.
In “Sou quem fui – Antologia Poética”, p. 127. Edições Ática,2000.
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