25.8.09

Diário de Notícias: Knut Hamsun: queimar a obra ou homenagear a sua arte?

"Não podemos entender que os noruegueses possam homenagear alguém que foi um criminoso e incitou crimes", dizia há pouco Baruch Tenembaum, fundador da Fundação Internacional Raoul Wallenberg, de defesa dos judeus. No início do mês, ergueu-se finalmente o Centro Hamsun, em Hamaroey, 320 quilómetros a norte do Círculo Ártico. E reergueram-se as vozes de protesto contra os ideais nazis de Knut Hamsun.
Após 15 anos aos sacões, entre a insuspeita qualidade da obra do Nobel da Literatura de 1920 e a sua confirmada ligação ao nazismo no seu ocupado país natal, abriu finalmente o Centro Hamsun, pólo das homenagens com que a Noruega lembra os 150 anos do nascimento do autor. Por entre gritos de protestos judaicos.
Knut Hamsun (Noruega, 4 Agosto 1859-19 Fevereiro 1952) foi prémio Nobel da Literatura em 1920, depois de Fome (1890), depois de Os Filhos da Terra (1917). "É o melhor escritor de sempre", disparou Thomas Mann (1875-1955, Alemanha), Nobel em 1929. "Não podemos entender que os noruegueses possam homenagear alguém que foi um criminoso e incitou crimes", dizia há pouco Baruch Tenembaum, fundador da Fundação Internacional Raoul Wallenberg, de defesa dos judeus. No início do mês, ergueu-se finalmente o Centro Hamsun, em Hamaroey, 320 quilómetros a norte do Círculo Ártico. E reergueram-se as vozes de protesto contra os ideais nazis de Knut Hamsun. A discussão é longa, extensa, antiga. Pode separar-se a obra do criador? As autoridades norueguesas acreditam que sim, ou melhor, acreditam que essa ligação pode ser útil: mantendo vivas as memórias do legado literário e as ideias sórdidas nazis, a Noruega mostra-se aberta, transparente, lúcida. "É também uma forma de não deixar esquecer", defende Bodil Børset, directora do Centro Hamsun que a Princesa Mette-Marit inaugurou no dia 4 de Agosto, 150 anos exactos sobre o nascimento de Knut Pedersen - Hamsun, assinatura artística, deriva de Hamsund, localidade que o escritor habitou na infância. A Noruega foi mais longe: há uma moeda e um selo comemorativos do século e meio de Knut Hamsun - o último de três Nobel da literatura noruegueses a receber a distinção.

O projecto 'Hamsun 2009', ou seja, a inauguração de um museu projectado há 15 anos (e, pelas polémicas, sucessivamente adiado), de homenagem à obra do escritor, levantou ondas de choque por todo o lado. "O aniversário de Hamsun não sanciona de maneira alguma o apoio que ele dava ao regime nazi. Ele foi largamente condenado por isso depois da guerra e as suas actividades pró-nazis devem continuar a ser condenadas", justificou-se o ministro dos Negócios Estrangeiros da Noruega, Jonas Gahr Stoere.
De facto, Hamsun, depois do fim da II Guerra Mundial, acabou preso por ter colaborado com as forças nazis que ocuparam a Noruega. E nunca pestanejou, até ao fim dos seus dias, na defesa de Hitler e do nacional-socialismo. "Ele era um guerreiro, um guerreiro pela humanidade e um profeta da verdade e da justiça para todas as nações", escreveu no obituário do ditador nas páginas do mais importante jornal do país, o Aftenposten (Correio da Noite).

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